A Internet nos deixa mais burros ou mais inteligentes?
Por Isabella Marques.
A internet inegavelmente tomou grande espaço em nossas
rotinas e alterou configurações da sociedade nos mais variados âmbitos. A
comunicação moldada de “um para muitos”, como é o exemplo da televisão e do
rádio, deu lugar ao compartilhamento e interatividade. Quais os efeitos disso
em nossas vidas?
Diferente das gerações anteriores, que crescerem vendo
televisão (ou seja, uma comunicação unidirecional no qual os receptores são
passivos, não há a possibilidade de interação), a era da web faz com que nós
produzamos conhecimento juntos, por meio do diálogo global. Todos têm iguais direitos
de acessar, debater e expor ideias sobre um determinado assunto, e para isso
basta um perfil no Facebook, acesso a fóruns de discussão, ou editar um verbete
no Wikipédia, por exemplo.
A facilidade em conseguir informações muda o conceito do que
chamamos de “conhecimento”: decorar e saber na ponta da língua o PIB da
Argentina, por exemplo, não possui a mesma relevância de antigamente, quando
hoje é simples procura-lo no Google. Compreender o que o número significa e
saber o que fazer com ele, por outro lado, já são outros quinhentos, algo muito
mais complexo.
Mas na rede, a compreensão dos mais diversos assuntos, por
sua vez, é aprimorada, pois torna-se objeto de novas reflexões e discussões,
"montado" como peças de um quebra cabeça, produzido de pessoas para
pessoas, cada um dando a contribuição que pode. Pouco a pouco, seria concebível
afirmar que estamos, juntos, compreendendo melhor o mundo via internet.
Em teoria, tudo muito lindo.
O estudioso Mark Bauerlein, porém, coloca: “Muitos se
perguntam qual o sentido de saber sobre Dom Pedro 2º quando dá para procurá-lo
na Wikipédia. Mas a questão é: estudamos dom Pedro 2º só para saber quando ele
nasceu, as coisas que ele fez e o ano em que morreu? Ou estudamos figuras
históricas como essa para desenvolver ideias sobre caráter, honra, inteligência
e moral?”.
A crítica de alguns atores está no fato de que não usamos a
web majoritariamente como essa ferramenta de diálogo e compreensão, mas sim
para fazer upload das nossas fotos e escrevermos futilidades.
O problema não está na internet, mas sim no uso que fazemos
dela. A começar pelo compartilhamento excessivo de informações, o que é evasivo
à nossa privacidade: nós podemos não nos lembrar do que dissemos há anos, mas
nas redes, fica lá memorizado, podendo um dia sendo usado contra nós.
Outro aspecto negativo está justamente no fato de qualquer
um poder criar conteúdo: nada garante que a informação seja verdadeira (e esse
é motivo pelo qual a Wikipédia talvez nunca seja aceita como fonte de
pesquisa). Infelizmente sempre haverá alguém que a compartilhará como se fosse
veraz, podendo causar todo o tipo de mal entendido.
Quanto aos efeitos a longo prazo, o professor inglês Mark
Bauerlein acredita que a internet piora a inteligência dos jovens em quatro
aspectos: curiosidade intelectual, conhecimento histórico, consciência cívica e
hábitos de leitura. Outros estudiosos sugerem também perda de concentração:
fazer mais de uma coisa a mesmo tempo geraria uma fixação de informações e
desempenho menor em cada uma das atividades.
Mas aí entra um porém: não parece certo dividir os efeitos
da web em "mais inteligentes" ou "mais burros", mas sim em
apenas "diferente"; estamos "desenvolvendo" um cérebro mais
adaptado/apropriado ao século XXI.
O conhecimento dos jovens parece mais superficial quando
comparado com conceitos engessados no passado, em que os inteligentes são
aqueles com boas notas, que acumulam livros lidos e se saem bem em ciências
exatas. As novas gerações entretanto já nasceram imersas nas tecnologias e na globalização;
o questionamento de ideias e ideais vigentes é consequência natural. Os modelos
educacionais e esteriótipos intelectuais estão ultrapassados em relação ao modo
como pensamos e nos comunicamos atualmente. Tirar notas altas, ler milhares de
livros e simplesmente saber recitar a formula de Bhaskara já não tem o mesmo
peso.
Don Tapscott, pesquisador canadense, exemplifica: “se os
jovens estão no local de trabalho a desperdiçar tempo no Facebook, isso não é
um problema de tecnologia. É um problema de fluxos de trabalho, motivação,
supervisão”.
Os testes aplicados para definir se as tecnologias nos
deixam mais estúpidos ou inteligentes são também baseados em concepções
antigas, realizados sem uma compreensão integral da efetividade das
tecnologias, e tão pouco de como funciona o cérebro de quem convive com elas
desde o dia em que nasceu. E isso por questão de tempo inclusive: a internet se
tornou acessível à população civil nos últimos 20 anos aproximadamente, e
portanto ainda é muito cedo para um veredicto sobre seus efeitos.
Estamos cada dia mais conectados, inseridos em um contexto
tecnológico que pede cada vez mais participação, desenvolvendo novas
habilidades e interesses. Por enquanto é apenas possível afirmar que a internet
propicia um aprimoramento intelectual individual em questões como a habilidade
em fazer variadas tarefas simultaneamente, pensamento lógico e capacidade de
tomar decisões, enquanto que num contexto mais amplo tem permitido a
humanização do conhecimento ao refletir quem nós realmente somos. Se isso é bom
ou ruim, só o tempo poderá dizer.
(Este texto foi baseado nos estudos, textos e obras dos
estudiosos Mark Bauerlein, Nicholas Carr, Don Tapscott e David Weinberger.).
Texto e imagem reproduzidos do site: obviousmag.org
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